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Crítica a Autobiografia, de José Luís Peixoto, in Diário de Notícias julho 2019

30.09.19

Saramago cabe num romance? José Luís Peixoto fez a experiência

TEXTO DE JOÃO CÉU E SILVA

 

José Luís Peixoto tem novo romance, Autobiografia. Uma poderosa ficção em que o autor mergulha no universo de José Saramago e utiliza o escritor como coprotagonista.

erá que José Saramago cabe num romance? A pergunta pouco feita pelos escritores portugueses é respondida nesta sexta-feira por José Luís Peixoto, autor de Autobiografia, um romance em que o Nobel da língua portuguesa existe como personagem estruturada. Peixoto, que vem embalado pelo romance Galveias - uma narrativa bem regionalista que chegou ao Japão, onde foi traduzido recentemente, e é um sucesso no Brasil -, deixou-se de medos e captou numa história com dois Josés: um escritor e um pretendente à mesma profissão.

As trezentas páginas que enredam os dois coprotagonistas, o José aspirante a escritor e o José Saramago, surpreendem e José Luís Peixoto atinge o nível que seria exigível a um dos (demasiados?) autores da geração 2000.

Esta é uma poderosa ficção em que o autor mergulha no universo de José Saramago e utiliza o escritor como coprotagonista. Uma espécie daquilo que o Nobel fez com o heterónimo de Fernando Pessoa em O Ano da Morte de Ricardo Reis e que irá surpreender pela habilidade literária com que José Luís Peixoto puxa até ao fim o fio da história.

Um desafio que o próprio Saramago fizera ao afirmar que queria colocar o Convento de Mafra num livro e o fez em Memorial do Convento, a obra que, segundo Eduardo Prado Coelho, lhe aumentou a "base social de apoio" fora das crónicas, de atitudes ideológicas e romances à esquerda anteriores.

Peixoto faz o mesmo, pega em Saramago e usa-o num romance sem receio do desafio.

José Luís Peixoto tinha um problema: é que José Saramago sempre escreveu livros que surpreendiam pelo seu coração criativo. Ora quebrava a Península Ibérica ora cegava os habitantes do mundo. Eram histórias que o leitor não esperava nem concebia como possíveis.

Como contornar essa capacidade de Saramago? A leitura de Autobiografia mostrará que Peixoto se instala num dos romances do Nobel para levantar ao contrário o edifício: O Homem Duplicado. Tal como o protagonista desse romance, Tertuliano Máximo Afonso, irá ver convergir duas personalidades numa única. Mas O Homem Duplicado não passa de uma muleta invisível e logo esquecida quando se fecha a leitura de Autobiografia, porque as personagens de Peixoto têm vida própria. Apesar de o escritor piscar os olhos a alguns dos nomes que o Nobel tornou conhecidos na sua obra.

Personagens à linha nos romances de Saramago

Há em Autobiografia um editor chamado Raimundo Silva como o revisor de História do Cerco de Lisboa, uma Lídia como a de O Ano da Morte de Ricardo Reis, um Mau-Tempo como o de Levantado do Chão ou um Bartolomeu como o de Memorial do Convento. Há uma Rua de Macau como aquelas em que os pais de Saramago alugavam quartos no início da sua vinda para Lisboa e muitas outras referências ao universo Saramago. Peixoto descreve o escritor e a mulher, Pilar del Río, como se comportavam de verdade.

Recupera as outras duas mulheres, Ilda e Isabel, e justifica muito da existência delas com Saramago por breves e importantes momentos definidores da sua personalidade. Refaz alguns passos do escritor com muita realidade, como nas impagáveis viagens de avião. Contudo, é em quatro parágrafos no fim da página 61 e toda a 62 que capta o ser Saramago na sua plenitude, quando descreve a forma como o escritor acorda e vai esquecendo os pensamentos noturnos.

Peixoto evita semelhanças com as particularidades da escrita saramaguiana, mesmo que de vez em quando ceda para satisfazer aquela que poderá ser a vontade do leitor ao pegar neste livro: ler um pouco à Saramago. Mesmo que a ambiência do romance faça recordar frequentemente alguns dos tiques narrativos do escritor, bem como o modo como interrompia a ação para que o narrador repusesse a ordem, José Luís Peixoto divorcia-se de qualquer facilitismo e Autobiografia é apenas dele. Porque é capaz de se libertar do peso do Nobel e criar uma narrativa muito sua, que até rivaliza com a envolvência dos romances de Saramago.

A leitura de Autobiografia irá despertar nos leitores de Saramago muitas das memórias que têm sobre os seus romances e é essa virtualidade que também engrandece o romance de José Luís Peixoto.

Após Autobiografia valerá a pena perguntar: espera-se hoje por algum romance de um dos novos autores portugueses, os da geração 2000, como se aguardava por um José Cardoso Pires ou um António Lobo Antunes - falemos só destes dois - nas duas décadas anteriores à passagem do milénio? Com o leitor ansioso e a passar na livraria à espera de se confrontar com mais um mito literário. A resposta é não, afinal são poucos os novos autores capazes de preencher um romance com a arte exigida pelo leitor. A surpresa chega inesperadamente às livrarias nesta sexta-feira com o romance Autobiografia, de José Luís Peixoto.

Argumento de Autobiografia em poucas palavras

Para evitar desvendar totalmente o novo romance de José Luís Peixoto, deixa-se aqui a informação que a editora Quetzal já revelou sobre Autobiografia: "Um jovem escritor, José, é incumbido de escrever a vida do consagrado escritor, José. Este é o ponto de partida do livro que marca o regresso de José Luís Peixoto ao romance (...). Autobiografia é a história dentro da história, um romance que junta o autor ao mais reconhecido dos escritores portugueses, José Saramago (...). Na Lisboa de finais dos anos noventa, um jovem escritor em crise vê o seu caminho cruzar-se com o de um grande escritor. Dessa relação nasce uma história que mescla realidade e ficção, um jogo de espelhos que coloca em evidência alguns dos desafios maiores da literatura."

(Crítica a Autobiografia, de José Luís Peixoto)

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Crítica a Autobiografia, de José Luís Peixoto

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Diário de Notícias, Dezembro 2016

06.12.16

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O livro do escritor português foi considerado o melhor em língua portuguesa editado este ano no Brasil.

O romance Galveias, do escritor português José Luís Peixoto, é o vencedor do prémio literário Oceanos, organizado pelo Itaú Cultural, no Brasil, foi anunciado pelo júri.

Peixoto e os outros três autores distinguidos este ano pelo Oceanos - Prémio de Literatura em Língua Portuguesa, os brasileiros Julián Fuks, Ana Martins Marques e Arthur Dapieve, foram escolhidos pelos curadores do galardão, a investigadora Selma Caetano, especialista na obra de Graciliano Ramos, e Manuel da Costa Pinto, jornalista e mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada, pela Universidade de São Paulo. Os quatro trabalhos vencedores foram apresentados esta noite, no Auditório Ibirapuera, em São Paulo. Peixoto recebe um prémio no valor de 100 mil reais, o que corresponde a cerca de 27 mil euros.

Para os críticos que escolheram o romance de Peixoto como o melhor livro do ano, em língua portuguesa, publicado no Brasil, a obra faz "um mergulho no Portugal profundo, rural, com uma narrativa que alinha personagens emblemáticas desse universo arcaico".

No geral, a categoria romance conquistou mais um prémio com A Resistência, do escritor Julián Fuks, que ficou em segundo lugar.

O volume de poesia O livro das semelhanças, de Ana Martins Marques, obteve o terceiro lugar, e Arthur Dapieve colocou-se como quarto vencedor, com os contos de Maracanazo e outras histórias.

Entre os dez finalistas do prémio estava o escritor português, Gonçalo M. Tavares, com o romance Uma menina está perdida no seu século à procura do pai.

Estes finalistas foram escolhidos por um júri, a partir de uma lista de 50 obras semifinalistas, provenientes de um grupo de 740 títulos concorrentes, dos diferentes géneros - poesia, romance, conto, crónica e dramaturgia. Além das obras de José Luís Peixoto e de Gonçalo M. Tavares, estavam também, entre os semifinalistas portugueses, os livros de poesia de Matilde Campilho, Jóquei, e do sociólogo Boaventura Sousa Santos, 139 epigramas para sentimentalizar pedras, e os romances Não é meia-noite quem quer, de António Lobo Antunes, e O pecado de Porto Negro, de Norberto Morais.

No ano passado, o prémio Oceanos, em primeira edição, que sucedeu ao Prémio Portugal Telecom de literatura, foi atribuído ao escritor brasileiro Silviano Santiago, de 80 anos, pelo romance "Mil Rosas Roubadas".

José Luís Peixoto nasceu em 1974, em Galveias, venceu o prémio José Saramago, em 2001, com o romance "Nenhum Olhar", o segundo da sua carreira, incluído na lista do Financial Times dos melhores livros publicados no Reino Unido, em 2007, e recebeu o galardão Salerno Libro d'Europa, em 2013, por "Livro", entre outras distinções. O escritor estreou-se na ficção com "Morreste-me", em 2000, a que se seguiram, entre outros, "Uma Casa na Escuridão", "Cemitério de Pianos", melhor romance estrangeiro publicado em Espanha, em 2007, e "Em Teu Ventre". As suas obras foram ainda finalistas de prémios internacionais como o Femina, em França, Impac Dublin, Irlanda, e o antigo Portugal Telecom, Portugal/Brasil. Em 2012, José Luís Peixoto publicou "Dentro do Segredo, uma viagem na Coreia do Norte", primeira incursão na literatura de viagens.

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Diário de Notícias, 15 outubro 2014

21.10.14

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Diário de Notícias, 15 Novembro 2012

15.05.14

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Diário de Notícias, 6 Novembro 2002

05.04.14

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Diário de Notícias, 24 de Dezembro de 2012

04.04.14

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NS, Diário de Notícias, 17 Novembro 2007

18.03.14

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Diário de Notícias, 7 Abril 2007

18.03.14

 

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Diário de Notícias, 10 Julho 2007

18.03.14

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Diário de Notícias, 1 Novembro 2003

14.03.14

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